Complemento à fala de Júlio Vertzman em 3 de Maio de 2020
À comissão de comunicação do GBPSF:
Em primeiro lugar gostaria de agradecer a acolhida de todos e todas durante a “live” do sábado passado, mesmo diante de um assunto como dor e catástrofe. Estou acostumado a falar para públicos de variados formatos e sei que, como em qualquer tipo de comunicação, algo sempre fica de fora, à espreita para escapar na primeira oportunidade ou permanecer em desolação rumo ao esmaecimento. Um tema, todavia, que eu não pretendia deixar de lado sucumbiu à minha pressão de fala e à minha ânsia de chegar ao fim, ainda inteiro, embora não incólume.
Apesar de ter feito menção e até apelo para que os e as praticantes da psicanálise se dedicassem, dos modos mais heterogêneos que existirem, ao trabalho coletivo de cuidado à catástrofe – fora do formato habitual do setting analítico – um aspecto central não foi objeto de minha comunicação. Trata-se do cenário de aprofundamento da desigualdade social que incide diretamente na cena analítica de nosso país durante a pandemia. Psicanalistas tem sido profissionais inestimáveis e reconhecidos no campo da assistência pública em saúde no Brasil. É corriqueiro nos depararmos com psicanalistas em salas dos CAPS e seus territórios, oferecendo escuta a equipes de clínicas da família, participando de estratégias inovadoras tais como consultórios na rua, lutando por práticas transformadoras em hospitais psiquiátricos ou hospitais gerais, ocupando cargos de gestão nos seus diversos níveis ou desempenhando uma função mais conhecida por nós em diferentes formatos de atendimento ambulatorial. A árdua construção do SUS possibilitou a escuta analítica ou orientada pela psicanálise para uma camada da população desde sempre excluída desta forma singularizada de cuidado. Neste momento de difusão forçada do atendimento remoto, é fundamental lembrar das dificuldades, por vezes intransponíveis, que muitos sujeitos que perfazem a clientela do SUS – extremamente vinculados à nossa forma de trabalhar – encontram para garantir a continuidade de seus tratamentos exatamente num contexto de máxima vulnerabilidade. Não creio que seja necessário enumerar tais obstáculos num país como o nosso. Dirigir a nossa atenção a um problema costuma ser o primeiro passo para seu enfrentamento. Durante uma catástrofe sanitária sem precedentes, precisamos, em qualquer oportunidade que tivermos, expressar nossa gratidão ao SUS e lutar pela superação de quaisquer de suas barreiras de acesso.
Solicito à comissão que divulgue esta mensagem aos membros do GBPSF, já que essa preocupação pode ser também a de muitos neste coletivo. Somente assim, a falta dessas palavras durante a nossa transmissão ao vivo, poderá se transformar em defesa conjunta desse verdadeiro patrimônio brasileiro de luta contra a desigualdade.Obrigado, Julio Verztman
Destinamos esse espaço para que os leitores da carta feita pelo participante possam manifestar suas opiniões na forma de comentários.
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